As desigualdades socioeconômicas do Brasil impactam fortemente na taxa de vacinação, mesmo em campanhas com aplicação gratuita. Essa é a conclusão de um estudo, publicado na revista Vaccine, que analisou 389 milhões de registros de vacinação no país dos anos de 2021 e 2022 para Covid-19. Liderado pelos epidemiologistas Alexandra e Antonio Boing, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), contou ainda com o sanitarista S.V. Subramanian, da Universidade Harvard, além de outras universidades.
Entre os resultados, observa-se que os municípios com pior cobertura da campanha, nos últimos dois anos de imunização para Covid-19, foram aqueles mais pobres, com menor escolaridade média, e maior população negra. Além disso, notou-se que a frequência da vacinação das mulheres era maior que a dos homens, e o grupo dos idosos – mais vulnerável ao coronavírus – se vacinou melhor que os adultos mais jovens.
Dessa maneira, os cientistas alertam que as disparidades entre locais com diferentes graus de desenvolvimento comprometem a universalidade do Programa Nacional de Imunização (PNI), presente em todas as regiões do país e que teoricamente deveria alcançar todo o público.
À medida que as doses da vacina para Covid-19 avançavam, a cobertura diminuía em praticamente todos os municípios. Ao analisar a terceira dose de reforço, foi possível perceber algumas diferenças de acordo com certos critérios. Por exemplo, ao dividir todos os municípios do país em cinco grupos usando o critério da educação, o grupo de adultos com nível de escolaridade média mais alto teve cobertura de reforço 43% melhor que o grupo no outro extremo. Entre idosos a diferença caiu para 19%.
Em relação ao critério racial, usando a mesma comparação e dividindo os municípios por “quintis” (cinco grupos de mesmo tamanho), o quintil que tinha população mais branca teve uma cobertura de reforço 24% melhor do que aqueles no quintil mais negro. Já em relação à análise por faixa de renda, os municípios no quintil mais rico se saíram 21% melhor. Quanto às diferenças entre gênero, houve taxas de cobertura superiores entre mulheres adultas quando comparadas às dos homens, variando de 118% a 25% mais altas ao longo do período analisado.
O estudo mostrou, portanto, que o movimento antivacina e o negacionismo científico não são os únicos motivos da queda da cobertura vacinal, mas também a desigualdade.
Umas principais causas da queda da cobertura vacinal é o acesso à vacina, ou seja, o acesso ao serviço de saúde, que é muito sensível a determinantes sociais. Infelizmente o nosso país é muito desigual. O sistema deveria ser equânime, mas a desigualdade coloca os mais pobres em desvantagem
Eder Gatti, infectologista e diretor do PNI
Há ainda a questão do planejamento, que envolve administração de doses fracionadas, logística, transporte e comunicação para fazer populações chegarem até o posto de saúde para vacinação no dia certo, ou alcançá-las com postos móveis. Sobretudo em áreas rurais, isso pode ser difícil.
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